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Primeiro coro de surdos do país atuou em Cascais

10 Fev 2023
Mãos que Cantam levou o fado de Amália à Biblioteca Municipal de S. Domingos de Rana, interpretado por um coro de pessoas surdas. O projeto é único no país e na Europa.

Esta foi uma tarde diferente na Biblioteca Municipal de S. Domingos de Rana. O projeto "Mãos que Cantam" atuou para um público que se foi deixando surpreender e encantar por aquele coro distinto em que as mãos representaram o papel principal.

Pela primeira vez foi possível "ouvir" com as mãos, o fado «Com que Voz» de Amália Rodrigues, sendo a primeira vez que esta forma musical, património imaterial da Humanidade e característica intrínseca da identidade portuguesa, é traduzido para Língua Gestual Portuguesa. Mas, também "Avé Maria", uma oração musicada teve uma interpretação única através da expressão corporal - o gesto - dos coralistas impedidos de ouvir mas não de fazer música.
Este é um projeto pioneiro que reúne alunos do Instituto da saúde da Universidade Católica e que tem como objetivo a integração simultânea de surdos e ouvintes, demonstrando que as pessoas surdas podem fazer parte de um coro e atuar em diversos ambientes musicais. A maioria são professores do Ensino Básico e Secundário para alunos surdos e estão a preparar-se, em termos de formação académica, para serem eles próprios professores de outros alunos surdos, multiplicando a ideia que as únicas barreiras que existem na vida são aquelas que construímos dentro da nossa cabeça.

Esta apresentação é o reflexo de um trabalho contínuo cuja finalidade artística é expressar em Língua Gestual Portuguesa determinados conceitos musicais, tais como a noção de intensidade, de polifonia, métrica e a estrutura formal de uma peça musical, para além da interpretação do poema em si.
O envolvimento dos participantes do coro no processo criativo é determinante e intenso, uma vez que o léxico necessário para a expressão artística na área da música é escasso. Os ensaios desenrolam-se ao longo de várias horas, dado que todos os gestos são criados e interpretados de raiz, pelos próprios coralistas, em colaboração com a intérprete de Língua Gestual Portuguesa e o maestro.

" Ao longo destes 12 anos de existência fomos construindo uma nova linguagem musical que veio demonstrar que pessoas surdas também podem integrar projetos musicais", referiu o maestro Sérgio Peixoto para quem este projeto foi também um grande desafio pessoal já que não tinha qualquer contato com pessoas surdas, nem conhecimentos de linguagem gestual.

"Mãos que cantam" nasceu da ideia de que os surdos não devem ser vistos como deficientes, mas como seres plenos com uma modalidade de expressão biologicamente diferenciada das pessoas que ouvem. No início deste projeto, os surdos coralistas e o seu maestro encantaram a UCP com a sua música nas mãos e pelas mãos e mostraram-nos a todos que a música vai para além do som e que a conseguimos apreender de forma visual. O coro serviu como plataforma de integração dos alunos surdos na universidade, mas foi muito para além disso, sendo que este projeto é apoiado pelo programa Partis da Fundação Calouste Gulbenkian.

O reportório do coro inclui peças como «Imagine» de John Lennon e «Eu Sei» de Sara Tavares. Para além destes temas, outros autores foram já trabalhados, como Jorge Palma, Pedro Abrunhosa, We Trust, Manuel Rebelo, Trovante, entre outros.

A disseminação deste projeto entre a comunidade de ouvintes e não ouvintes tem um impacto profundo do ponto de vista cultural e, sobretudo, pedagógico. A experiência de trabalho e de inclusão permanente, de trocas entre vários mundos aparentemente separados tem suscitado uma intensa gratificação em todos os intervenientes: o aumento da autoestima dos coralistas surdos, a perceção e integração da diferença nos coralistas ouvintes, a experimentação artística por via da participação no espetáculo e a própria perspetiva multidisciplinar do projeto. Integra uma componente artística, mas também educacional e de bem-estar social.

Saiba mais sobre o projeto "Mãos que Cantam" aqui

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